Desde Antônio Britto, todos os governos contribuíram para tornar o programa de concessões danoso aos motoristas
Passados quase 15 anos, às vésperas do término do programa estadual de concessões rodoviárias, a sensação é de que a exacerbada ideologização do debate sobre as estradas pedagiadas só fez uma vítima: o contribuinte.
Acossado por estradas de baixa qualidade, com pouca capacidade de tráfego e tarifas salgadas, o usuário não contou sequer com as autoridades: sem exceção, os últimos governos, desde 1995, contribuíram para piorar o cenário, com descumprimento de acordos, derrotas no Judiciário, remendos aos contratos e atos de negligência.
Enquanto os partidos transformaram a questão dos pedágios em motivo de batalha, com embates incendiários na Assembleia, o sistema rodoviário afundou. Hoje, 54,7% das estradas estaduais são pavimentadas. Neste quesito, os gaúchos estão atrás de Santa Catarina, Paraná, Acre, Amazonas, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Alagoas. E apenas 3,1% da malha é duplicada.
A situação dramática é escancarada pelos números: somente para a manutenção de todas as rodovias estaduais, seriam necessários investimentos anuais de R$ 1 bilhão. Mas, na média dos últimos 25 anos, o Estado reservou somente R$ 350 milhões para esta finalidade. Um abissal déficit de R$ 650 milhões ao ano.
Receita dos polos superou gastos nas estradas em R$ 1 bi
Sem dinheiro, o Planalto organizou em 1995 o programa de concessões rodoviárias. O Banco Mundial foi peça fundamental na adoção da política: avisou que não mais emprestaria dinheiro para a construção de estradas em países que não aplicassem planos de manutenção permanente das rodovias.
O movimento da União foi acompanhado por Rio Grande do Sul, Paraná e São Paulo. O então governador Antônio Britto assinou, em 1998, contratos de concessão de sete polos.
O fato de Britto ter feito contratos alinhados a um programa federal, ao qual se juntaram outros Estados de forma semelhante, enfraquece o mito de que os contratos de pedágio do Rio Grande do Sul são malévolos e responsáveis por todos os problemas.
– Não vejo os contratos como problema. Eles previram obrigações e deveres. As concessionárias também não os cumpriram plenamente, e o Estado nunca teve estrutura para fiscalizar – avalia o diretor de Operações Rodoviárias do Daer, Cleber Domingues.
Entre 2000 e 2008, as empresas arrecaram R$ 1 bilhão a mais do que investiram em manutenção de estradas. Procurada por Zero Hora, a associação das concessionárias não retornou ao pedido de entrevista.
Foi a má gestão, acrescida da guerra política, que construiu o monstro dos pedágios. Britto, meses depois de assinar o contrato, foi o primeiro a descumprir o reajuste tarifário previsto. Não quis se render ao slogan eleitoral do PT, que o chamava de “pedágio” e anunciava Olívio Dutra como “caminho”.
Olívio assumiu o Piratini buscando imprimir ideias revolucionárias. Com um canetaço, reduziu o pedágio em até 28%. Meses depois, foi derrotado na Justiça. Os solavancos ameaçavam o programa. Em meio à crise, Olívio e o então secretário de Transportes, Beto Albuquerque, que hoje ocupa cargo equivalente no governo Tarso Genro, ofertaram às empresas o termo aditivo 1.
A solução foi responsável por elevar em 33% a tarifa dos veículos de passeio, por instalar a cobrança nos dois sentidos e por reduzir os padrões de qualidade das estradas. Tudo para compensar as perdas que as concessionárias somavam. Os tropeços prosseguiram nos governos seguintes. Quinze anos depois, a população segue no prejuízo.
Peculiaridades dos contratos do RS
— O modelo de polos pressupõe que a arrecadação em uma estrada de grande movimento ajudará a sustentar investimentos em rodovias menos movimentadas do entorno.
— A licitação não foi vencida pela oferta de menor tarifa. O governo fixou a tarifa e definiu que venceria a concorrência quem aceitasse mais estradas.
— Se outros Estados fizeram contratos de 25 anos, o RS optou por 15.
— Conforme Luiz Afonso Senna, PhD em Transportes, o modelo gaúcho é definido como LDOT (Leasing, desenvolvimento, operação e transferência). Pressupõe apenas manutenção de rodovias e pequenas obras. Típico de estradas com tráfego limitado.
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