Denise Madueño, Eugênia Lopes e João Domingos, de O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA -
Com ameaças de cortes nas nomeações para o segundo escalão e até de demissão de um ministro aliado, a presidente Dilma Rousseff conseguiu fazer sua base parlamentar aprovar o salário mínimo de R$ 545 e passou por seu batismo de fogo no Congresso. Maioria expressiva dos aliados obedeceu à ordem do Executivo e rejeitou, por 361 votos a 12o, a proposta que elevava o valor para R$ 560. O projeto ainda terá de ser aprovado pelo Senado para virar lei. A liberação de emendas no mês de fevereiro também foi outra arma usada pelo Executivo.
Os partidos de oposição insistiram com dois valores acima do defendido pelo governo. Em primeiro lugar, na votação de um mínimo de R$ 600, proposto pelo PSDB, o governo ganhou com folga. Apenas 106 parlamentares votaram a favor. Contrários à emenda votaram 376 e 7 se abstiveram. Na segunda votação, quando apoiaram os R$ 560, os oposicionistas conseguiram mais 14 votos. Ainda assim, a oposição sofreu uma severa derrota.
A presidente tinha certeza da vitória. Assim que foi derrubada a proposta da oposição de R$ 600, perto das 23 horas, Dilma Rousseff deixou o Palácio do Planalto antes mesmo de encerrada a votação na Câmara. Ela acompanhou a sessão em seu gabinete, no terceiro andar do Palácio, acompanhada dos ministros da Casa Civil, Antonio Palocci, da Secretaria-Geral, Gilberto Carvalho, das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, e da Comunicação Social, Helena Chagas.
Ao deixar o Planalto por volta de meia noite, Palocci comemorava a vitória do governo com cautela: "Ainda falta o segundo tempo no Senado".
Enquadrados. O enquadramento dos deputados aliados ficou claro logo pela manhã. Numa reunião no Planalto com o ministro Luiz Sérgio, os líderes contaram os votos e o número de dissidentes e concluíram que venceriam. Mas teriam de fazer novas pressões para reduzir as baixas.
Ao PDT, o único partido aliado que anunciou a defesa do mínimo de R$ 560, a presidente Dilma avisou que se o partido fechasse questão em torno desse valor o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, seria demitido.
Restou ao partido deixar a bancada livre para que cada um votasse do jeito que quisesse.
Como as ameaças de resistência ao mínimo de R$ 545 vinham principalmente da base, os dirigentes partidários foram duros no trabalho de convencimento.
O líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), conversou com cada um dos deputados. Avisou que se insistissem em votar contra o governo o enfraqueceriam. Ele argumentou que uma dissidência alta no PMDB inviabilizaria seu projeto de assumir a presidência da Câmara no biênio 2013 a 2015.
Prevenido, o PMDB sacrificou dois suplentes de deputados do Rio de Janeiro, substituindo-os pelos titulares Leonardo Picciani e Pedro Paulo, atualmente secretários do governo de Sérgio Cabral (PMDB) e do prefeito Eduardo Paes (PMDB).
A partir daí, parlamentares da base revezaram-se na tribuna da Câmara para dar o apoio ao mínimo defendido por Dilma. A oposição, ao contrário, procurou mostrar a cara e defender um mínimo maior, de forma a contentar os sindicalistas que estavam nas galerias.
Vaias. Ocorreu, assim, um fenômeno raro na política brasileira. Parlamentares de tradição na esquerda, como Vicente Paulo da Silva (PT-SP), o Vicentinho, ex-presidente da CUT, e Luci Choinacki (PT-SC) foram vaiados; deputados acostumados a vaias de representantes dos trabalhadores, como Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Pauderney Avelino (DEM-AM), foram aplaudidos pelos sindicalistas que estavam nas galerias.
Vicentinho previu que se vingará no futuro: "Tenho certeza de que as vaias vão se transformar em aplausos ano que vem".
A argumentação dos dois lados seguiu uma linha muito parecida. Os defensores dos R$ 545 insistiram que o governo do PT, a começar pelo de Luiz Inácio Lula da Silva, conseguiu dar ganho real superior a 60% ao salário mínimo. A oposição repetiu e repetiu que negar mais R$ 15 aos trabalhadores - ou R$ 0,50 por dia - era uma falta de sensibilidade.
A vitória de Dilma representa o fim da lua de mel do Planalto com as centrais sindicais, que tiveram tratamento privilegiado sob Lula. / COLABOROU TÂNIA MONTEIRO
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